GONÇALVES, MG (FOLHAPRESS) — A primeira pessoa com Covid-19 a morrer na fila de espera por uma UTI (Unidade de Terapia Intensiva) na cidade de São Paulo é um jovem que tinha apenas 22 anos.
Renan Ribeiro Cardoso esperou 46 horas uma vaga num leito de UTI e acabou sendo vítima do colapso do sistema de saúde que atinge em cheio a maior cidade do país.
O óbito foi registrado no dia 13, mas só foi tornado público nesta quinta-feira (18) pelo prefeito Bruno Covas (PSDB). “Não dá mais para a gente ter um jovem de 22 anos que vem a óbito em 46 horas por não conseguir um leito de UTI na cidade de São Paulo”, disse Covas em entrevista coletiva.
A circulação de novas variantes do coronavírus tem mudado o perfil das vítimas. Agora, os jovens infectados pelo vírus têm chegado às unidades de saúde em estado mais grave e demandado mais tempo de internação nas UTIS, quando encontram um leito disponível.
Não foi o caso de Renan. Ele deu entrada no Pronto Atendimento São Mateus II, na zona leste da capital paulista, por volta das 19h do dia 11 deste mês.
O paciente apresentou à equipe médica que o atendeu o resultado de um exame que atestava que ele estava com Covid-19 confirmada havia dois dias.
Perguntado sobre o que mais o afligia, o jovem disse que sentia muita falta de ar e outros incômodos respiratórios, a chamada dispneia. Renan não respirava direito havia sete dias. Também estava com febre e saturação de oxigênio na casa dos 92% em ar ambiente.
Naquele momento, o jovem apresentava desconforto respiratório leve, mas era obeso, uma situação que deixou a equipe médica em alerta. O paciente foi colocado em observação e teve à disposição oxigênio para melhorar seu fluxo respiratório.
O documento, que relata a internação do paciente, mostra que a equipe médica inseriu Renan na Cross (Central de Regulação de Ofertas de Serviços de Saúde) no dia 12 em busca de um leito disponível.
“Devido à não melhora do quadro e prevendo uma possibilidade de complicação, inerente ao quadro de Covid-19, iniciamos a busca por um leito de internação”, escreveu Phelipe Camarinha, o coordenador médico do São Matheus II.
O quadro clínico de Renan só piorou. Por volta das 16h já do dia 13, a saturação do paciente atingiu 77% mesmo com o uso de oxigênio. Camarinha relata que não havia, naquele momento, ventiladores disponíveis na unidade e a central de regulação foi novamente acionada para remover Renan para um hospital que tivesse o equipamento.
Em 15 minutos, a unidade conseguiu o ventilador mecânico, mas não a vaga de UTI que tanto Renan necessitava. A piora do quadro clínico do jovem aumentou e, na sequência, o paciente apresentou uma iminente insuficiência respiratória.
A equipe médica relata que conseguiu falar com o paciente e o pai dele e, naquele momento, foi indicada uma intubação orotraqueal (introdução de um tubo para levar oxigênio a partir da traqueia).
Às 16h20, Renan foi levado para a sala de urgência, onde foi monitorado, sedado e intubado. O ventilador mecânico foi acionado, mas o jovem teve uma parada cardiorrespiratória.
Em desespero, a equipe médica iniciou manobras de ressuscitação, mas já era tarde. Renan faleceu às 17h19, numa batalha inglória de 46 horas por um leito de UTI.
Dezenove minutos após o óbito, o leito que Renan aguardava com tanto afinco surgiu, mas o próprio médico que atendeu o jovem respondeu, com frustração: infelizmente sem tempo hábil para o nosso paciente.