A Justiça Eleitoral decidiu, nesta quarta-feira (5), cassar toda a chapa de vereadores do PSD que disputou vaga na Câmara Municipal de Croatá (na região da Ibiapaba), após serem identificadas três candidaturas fictícias de mulheres, configurando fraude à cota de gênero.
O recurso ajuizado no Tribunal Regional Eleitoral do Ceará pela Comissão Provisória do partido foi negado. O PSD ainda pode recorrer junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Essa é a primeira vez que uma chapa de vereadores é cassada por fraude à cota de gênero no Ceará.
Com a decisão do TRE-CE, todos os votos recebidos pela sigla no município podem ser anulados. A Justiça Eleitoral determinou ainda a cassação dos diplomas de candidatos eleitos e de suplentes do partido e impôs sanção de inelegibilidade por oito anos às três mulheres que integram a lista.
Em 2020, a sigla elegeu um vereador no município – Zé Mário da Repartição. No entanto, como ainda cabem recursos, ele deve continuar no cargo.
“A consequência da fraude à cota de gênero é a cassação de todos os candidatos vinculados ao DRAP, independentemente de prova da sua participação, ciência ou anuência”, disse o juiz Francisco Eduardo Torquato Scorsafava.
O DRAP é o Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários, necessário para que o partido ou coligação sejam habilitados pela Justiça Eleitoral para participarem das eleições.
Scorsafava analisou o pedido de recurso da decisão da primeira instância, que já tinha determinado a cassação da chapa e a inelegibilidade de quatro candidatos do PSD – as três candidatas fictícias e um candidato diretamente beneficiado.
A decisão inédita na Justiça cearenses se baseia em julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF), de 2019, no qual foi definido que a presença de candidaturas laranjas ou fictícias para fraudar a cota de gênero deve levar à cassação de toda a chapa eleitoral, com a perda do mandato dos eleitos.
APLICAÇÃO DA DECISÃO JUDICIAL
A decisão do TRE, no entanto, não é imediata. Após a publicação do acordão com a decisão do TRE, o que deve ocorrer até a próxima sexta-feira (7), o partido ainda tem prazo para recursos na segunda instância, como o pedido de embargo.
Caso a Corte mantenha a decisão ao fim dos recursos, será feita uma recontagem dos votos válidos destinados as candidaturas proporcionais para saber qual agremiação terá direito a vaga na Câmara de Croatá. Ainda cabe também recurso no Tribunal Superior Eleitoral.
Procurada, a presidente do Legislativo Municipal, Eunice Magalhães (MDB), disse que o vereador Zé Mário segue trabalhando normalmente enquanto não chegar um notificação da Justiça Eleitoral.
Caso a cassação seja consumada, o MDB ou o PDT irá ganhar mais uma vaga na Câmara Municipal de Croatá, tendo em vista que apenas as duas legendas e o PSD tiveram candidaturas proporcionais na cidade.
Lá, o MDB tem o maior número de votos válidos em vereadores: cerca de 5 mil, ao todo – conforme consultado na plataforma de resultados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
IDENTIFICAÇÃO DE CANDIDATURAS FICTÍCIAS
A Justiça Eleitoral identificou fraude nas candidaturas de Geislaine Lorrayne Martins Bezerra, Luana Ferreira de Oliveira e Cinaria Maria dos Santos.
A decisão detalha as evidências da intenção de burlar a cota de gênero, estabelecida por legislação federal. Dentre elas, a de que duas das três candidatas não obtiveram voto, enquanto apenas Cinaria teve um voto na disputa eleitoral.
“O que não parece crível, pois nem mesmo a própria candidata, familiares e círculo de amizade próximo dedicaram-lhes voto”, argumenta o texto.
Constatou-se também inexistênca de gastos com material de campanha, além da declaração de despesa das três candidatas ser idêntica: de R$ 1.000,00, sendo o gasto de R$ 500,00 para o advogado e R$ 500,00 para o contador, a título de honorários.
Não houve também nenhum ato de campanha, mesmo nas redes sociais. Pelo contrário, a candidata Geislante Lorrayne Martins Bezerra pediu votos para o candidato concorrente e marido, Elizeu de Aquino. Junto com as três candidatas apontas como fictícias, Elizeu também foi declarado inelegível.
Luana Ferreira de Oliveira fez campanha apenas para o candidato a prefeito pelo PSD, Edilson Feliciano.
“Restou, assim, comprovado de forma inconteste e por meio de provas robustas que as candidatas com candidaturas fictícias em nenhum momento participaram, de maneira efetiva, do pleito eleitoral de 2020, constando na lista de candidaturas do PSD apenas com a finalidade de superar um obstáculo legal ao deferimento do DRAP do partido”, conclui a decisão.
DEFESA DAS CANDIDATAS
As candidatas apresentaram sua defesa. Segundo Luana Ferreira, problemas pessoais e familiares fizeram com que a família e pessoas próximas retirassem o apoio à candidatura.
Ela, então, “optou por não mais dar seguimento a sua campanha eleitoral e de consequência às suas pretensões políticas”. Luana Ferreira alegou ainda que não comunicou a decisão ao partido.
Cinaria Maria dos Santos, por sua vez, alegou que realizou campanha eleitoral apenas presencialmente, com pedidos de voto na comunidade onde reside e adjacências.
Por sua vez, Geislane Lorrany afirmou que, após a candidatura do marido, Elizeu de Aquino, ser deferida pela Justiça Eleitoral, ambos passaram a realizar campanha exclusivamente em favor dele.
Segundo a Justiça Eleitoral, nenhuma das três candidatas ou o partido apresentou pedido de renúncia.
Procurado pela reportagem, o PSD Ceará informou que o diretório municipal do partido irá entrar com recurso.
“O Diretório Estadual do PSD, respeita a decisão do TRE, reafirmando suas bandeiras de fomento à participação feminina na política e esclarecendo que a escolha de candidaturas em eleições municipais é prerrogativa dos diretórios Municipais”, completa a nota.